novembro 06, 2010

silly.

Aquele carro. Ninguém sabia que ela tinha saído, quem dirá que tinha “roubado” o carro de seus pais para esse passeio noturno.

Ok, não era bem um passeio. A forma mais adequada de se descrever aquilo, seria uma fuga noturna, uma fuga da realidade, da vida ela, das coisas que andavam acontecendo… Nada disso deveria acontecer.

Você já foi pra Paris, ou viu fotos e percebeu que de noite, é um dos lugares mais bonitos do mundo? Com as luzes, castelos, la Seine… Toda aquela beleza, naquele momento, a fazia vomitar. Tinha se tornado uma tortura e um motivo de suicídio pra ela. Como suportar um exterior tão bonito enquanto o interior dela estava podre? Ela tinha sorte de ter pego o carro da mãe dela, a Twingo verde, mais discreto do que a Picasso cor de areia. Poderia haver pedófilos em todo lugar aquela hora da noite, principalmente do tipo que não hesitaria um minuto em seqüestrar uma linda jovem num carro no meio da madrugada.

Ela tinha conectado seu iPod na entrada USB do player do carro, a nova descoberta de sua mãe. Dentro daquele carro, as ondas da música, as batidas das canções pareciam fazer tremer as janelas, seus ossos, invadindo todo o seu corpo. Era bom. Era como ter um show em “seu” próprio carro.

Ela tinha optado pelos britânicos, aquele sotaque delicioso daria conta. The Kooks e Arctic Monkeys cuidariam de seu estado. O final de Fake Tales of San Francisco ecoava em suas últimas notas para deixar espaço à Love It All.

Thiago, seu melhor amigo, ia ficar preocupado. Logo iam dar 3h30. Quando ele voltasse de seu mijo de toda madrugada (devido ao problema de bexiga pequena, ele geralmente ia esvaziá-la no meio da noite, normalmente entre 3h30 e 4h) e não a visse em sua aconchegante cama, ligaria direto pra ela. Era melhor voltar para casa antes de acontecer algum tipo de merda; como um morcego bater no carro, ou atropelar um esquilo.

Ah, sim, ela morava com o seu melhor amigo, e com os seus pais também. Tinha lá seus prós e contras… Ela sempre quis ter um irmão mais velho e, bem, agora ela o tinha. E ela tinha que suportar a super-proteção dele, mas não reclamava disso. Só reclamava quando ele entrava realmente no papel de irmão-super-protetor e ficava interrogando os caras com quem ela estava ficando há apenas 3 dias.

Agora ela encontrava as cuecas dele jogadas em cima de sua cama, ficava com vontade de vomitar todo dia de manhã quando acordava e sentia aquela porcaria de cheiro excessivo de perfume de homem, e tinha que lidar com as namoradas ciumentas dele.

Enfim, não mais, ele finalmente tinha achado alguém que prestasse, graças a Deus. Mas essa também levou um tempo pra entender que eles eram só amigos. A coisa de chegar lá e descobri-la de camiseta e calcinha deitada no colo dele assistindo um daqueles programas imprestáveis das noites de Terça a irritou durante um bom, bom tempo. Mas ela acabou entendendo. Melhor pra ela, ou ela entendia ou ia embora. A amizade de anos deles não iria mudar por causa dela, nem de ninguém.

Tanto faz, ela estava pra casa. Estava orgulhosa dela mesma, não tinha chorado.

Ela tentou, realmente tentou estacionar o carro como ele estava antes para seus pais não perceberem o pequeno empréstimo sem autorização, mas ela tinha apenas acabado de tirar a carta, milagres não acontecem. Ela abriu a porta da garagem cuidadosamente pra ninguém ouvir o barulho, e finalmente entrou em casa sentindo aquele calor agradável do aquecedor. O frio lá fora era de -10° naquela noite.

Quando ele a viu na porta do quarto de calça legging, blusão de marca que provavelmente um de seus ex tinha esquecido na sua casa e os seus tênis adidas, ele sabia que ela não tinha apenas ido tomar um copo d’água. Ele estava sonolento, mas tinha certeza de que não estava sonhando.

- Foi pra onde?
- Hã? Fui na cozinha, vai mijar e volta a dormir vai.
- Que horas são?
- 3h32.
- Só? Achei que fossem umas, sei lá, 4h. E você tá de tênis, otária. Não me engana. Sem contar que você precisa aprender a ser discreta, eu ouvi o carro estacionando, você tem realmente muita sorte se os seus pais não ouviram.
- Você fode, né? Fui dar uma volta, tava com a cabeça cheia… E você sabe como eu sou.
- É por causa daquele otário?
- Talvez, mas eu também não tô conseguindo fazer aquele exercício de ma…
- Vem cá.

Ele sentou em sua cama e abriu os braços. Seu refúgio. Ela segurou as lágrimas, ele não as merecia. Thiago beijou o topo de sua cabeça e disse:

- Tudo vai ficar bem. A gente vai achar uma solução, juntos. Amanhã a gente conversa melhor, tá? Vai dormir, eu vou ir mijar porque a minha bexiga tá prestes a explodir.

Continuarei talvez, ou talvez não continuarei.

Um comentário:

Simone disse...

Rondas noturnas de carro...
Só você e o som do iPode...
Demais!!Liberdade tranquilidade fuga da realidade.
E deixa pra depois...o irmão...o ex...a matemática...os pais...o tênis adidas...
A vida sendo ação-sim,não-talvez!
Sempre em frente seguindo o fluxo.
Too Much of Nothing-The Kooks para acompanhar!!